sexta-feira, 7 de julho de 2006

Vou-me embora para Pasárgada

A primeira vez que ouvi esta poesia foi, muito provavelmente, de minha mãe ou meu avô - Um dos dois. Me lembro, inclusive, de estar reclamando da vida de alguma coisa tão importante que nem me lembro mais, e então, me responderam: "- Pois vá-se embora para Pasárgada!" - É claro que minha reação foi questionar: "- O que é Pasárgada?". Aí já se vão alguns anos, mas indubtávelmente ainda não conheci melhor opção de refúgio.
(Quem me lembrou esta poesia há pouco foi minha mãe, a quem mais amo no mundo)

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que eu nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Manuel Bandeira