domingo, 29 de julho de 2007

Eu e a brisa

Nós aqui neste país pobre de tão rico (ou rico de tão pobre), temos uma fartura literárea, poética e musical digna de si mesmo. A expressão da poesia é muito relacionada à música. É por isso que me incomoda tanto ver tanta falta de cuidado nas palavras das músicas mais tocadas nas rádios populares; Mas, é aí que entra outra grande riqueza: a diversidade.
Dei-me uma pausa da poesia crua e venho para esta semana com uma letra de Johnny Alf, Eu e a Brisa. Trata-se de uma das poesias mais delicadas e modestas que já li. Simples. Faço questão de dividí-la, fundamentalmente por sentir falta de tantos elementos e atributos que, aqui, esta poesia esbanja. Boa semana!

...

"Ah! se a juventude que esta brisa canta
Ficasse aqui comigo mais um pouco
Eu poderia esquecer a dor
De ser tão só prá ser um sonho
Dai então quem sabe alguém chegasse
Buscando um sonho em forma de desejo
Felicidade então prá nós seria
E , depois que a tarde nos trouxesse a lua
Se o amor chegasse eu não resistiria
E a madrugada acalentaria a nossa paz
Fica, oh brisa fica pois talvez quem sabe
O inesperado faça uma surpresa
E traga alguém que queira te escutar
E junto a mim , queira ficar"

Johnny Alf

quinta-feira, 26 de julho de 2007

A morte absoluta

Desculpem-me sinceramente aos amigos que acompanham-me por aqui. Nos úlitmos dias tive um encontro de muitas para resolver e indefinições em minha cabeça. Sei não, mas as últimas semanas muitas coisas aconteceram, para todos os lados; Mas é para ser assim, não? Os dias passam independente de nós e as coisas acontecem a todo tempo, em todos os lugares. Bem diz é minha mãe quando censura nossos hábitos de negarmos a certeza da morte desperdiçando bons momentos da (incerta) vida de agora.

E, então, depois de tomar emprestado algumas de Pessoa e Drummond, os mais presentes nos últimos, trago Quintana. Pretendo explorar um pouco de sua obra, trazendo algumas das valorosas linhas que escrevera. Boa leitura!

...

Morrer.
Morrer de corpo e de alma.
Completamente.

Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão - felizes! - num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.

Morrer sem deixar porventura uma alma errante...
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?

Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança de uma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento,
Em nenhuma epiderme.

Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: "Quem foi?..."

Morrer mais completamente ainda,
- Sem deixar sequer esse nome.

Mário Quintana

quinta-feira, 19 de julho de 2007

A Longo Prazo

Durante toda esta semana, por conta do epsódio desnecessáriamente violento ocorrido com a TAM, deu-me uma mistura de sentimentos entre fragilidade e motivação. Definitivamente o que houve não passou por mim, pegou e ficou. Vi o como a vida é um triz, um soslaio, um quase. E, assim, vi-me descuidado e, inclusive, muito indisciplinado ao que refere-se aos agradecimentos que se fazem intimamente necessários visto minha boa saúde, familia e tudo o que me enriquece. Refleti.
Com isso, lembrei-me de um texto de Pedro Bial o qual me indentifiquei muito com o conteúdo. Foi publicado dia depois da morte prematura de um colega de trabalho dele. Já havia postado esta mensagem, mas tomo a liberdade de repetí-la.

...

Assisti a algumas imagens do velório do
Bussunda, quando os colegas do Casseta & Planeta deram seus depoimentos.
Parecia que a qualquer instante iria estourar uma piada. Estava tudo sério
demais, faltava a esculhambação, a zombaria, adesestruturação da cena.Mas nada
acontecia ali de risível, era só dor e perplexidade, que é mesmo o que e causa
em todos os que ficam.

A verdade é que não havia nada a acrescentar no roteiro: a
morte, por si só, é uma piada pronta. Morrer é ridículo.Você combinou de jantar
com a namorada, está em pleno tratamento dentário, tem planos pra semana que
vem, precisa autenticar um documento em cartório, colocar gasolina no carro e no
meio da tarde morre. Como assim? E os e-mails que você ainda não abriu, o livro
que ficou pela metade, o telefonema que você prometeu dar à tardinha para um
cliente? Não sei de onde tiraram esta idéia: morrer. A troco? Você passou mais
de 10 anos da sua vida dentro de um colégio estudando fórmulas químicas que não
serviriam pra nada, mas se manteve lá, fez as provas, foi em frente. Praticou
muita educação física, quase perdeu o fôlego, mas não desistiu. Passou
madrugadas sem dormir para estudar pro vestibular mesmo sem ter certeza do que
gostaria de fazer da vida, cheio de dúvidas quanto à profissão escolhida, mas
era hora de decidir, então decidiu, e mais uma vez foi em frente...De uma hora
pra outra, tudo isso termina numa colisão na freeway, numa artéria entupida, num
disparo feito por um delinqüente que gostou do seu tênis. Qual é? Morrer é um
chiste. Obriga você a sair no melhor da festa sem se despedir de ninguém, sem
ter dançado com a garota mais linda, sem ter tido tempo de ouvir outra vez sua
música preferida. Você deixou em casa suas camisas penduradas nos cabides, sua
toalha úmida no varal, e penduradas também algumas contas. Os outros vão ser
obrigados a arrumar suas tralhas, a mexer nas suas gavetas, a apagar as pistas
que você deixou durante uma vida inteira. Logo você,que sempre dizia: das minhas
coisas cuido eu! Que pegadinha macabra: você sai sem tomar café e talvez não
almoce, caminha por uma rua e talvez não chegue na próxima esquina, começa a
falar e talvez não conclua o que pretende dizer.

Não faz exames médicos, fuma
dois maços por dia, bebe de tudo, curte costelas gordas , mulheres e morre num
sábado de manhã. Se faz check-up regulares e não tem vícios, morre do mesmo
jeito. Isso é para ser levado a sério? Tendo mais de cem anos de idade, vá lá, o
sono eterno pode ser bem-vindo. Já não há mesmo muito a fazer, o corpo não
acompanha a mente, e a mente também já rateia, sem falar que há quase nada
guardado nas gavetas. Ok, hora de descansar em paz. Mas antes de viver tudo,
antes de viver até a rapa? Não se faz. Morrer cedo é uma transgressão, desfaz a
ordem natural das coisas. Morrer é um exagero. E, como se sabe, o exagero é a
matéria-prima das piadas. Só que esta não tem graça. Por isso viva tudo que há
para viver.Não se apegue as coisas pequenas e inúteis da
Vida...Perdoe....sempre!!!



Pedro Bial

segunda-feira, 16 de julho de 2007

Não Passou

Muitas das coisas que tento, com insistência exagerada, em minhas linhas é arrumar palavras que me valham um sentimento, às vezes dois ou três. Penso que na maioria das vezes fracasso; Muito embora, o exercício me valha demais. Faz-me bem, ao menos, tentar. No entanto, a discussão atual que mais me entretem é o fato da real existência destes sentimentos exagerados: Amor demais, dor demais, tempo demais. Tudo é demais? Não pode se tratar de idéia pura, é exagero de meninice - Criançola, como li em Dom Casmurro;

"A experiência de nada serve à gente.
É um médico tardio, distraído:
Põe-se a forjar receitas
quando o doente já está perdido..."
Mário Quintana
...
NÃO PASSOU
Passou?
Minúsculas eternidades
deglutidas por mínimos relógios
ressoam na mente cavernosa.
Não, ninguém morreu, ninguém foi infeliz.
A mão- a tua mão, nossas mãos-
rugosas, têm o antigo calor
de quando éramos vivos. Éramos?
Hoje somos mais vivos do que nunca.
Mentira, estarmos sós.
Nada, que eu sinta, passa realemente.
É tudo ilusão de ter passado.
Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Versejo

Nas lisuras sútis do engano;
Em persistências às retinas (minhas) aflitas,
retiro o que há de humanidade em minhas fitas,
e vou ter com o mundo, antes profano,
médios diálogos entre o mim e o jamais.
Peço franco perdão, enfim, ao voltar de trono nenhum:
Ei-nos de rigorosos tratos divinos absolutos e iguais
abençoados os que atendem por chamamento algum,
por saberem-se sagrados e imperfeitos demais; Demais.
Ao mais, tudo o que há, é caminho.
Desleal de medida precisa àqueles cândidos quais, ainda, são;
Os que deitam e apontam estrelas e, mesmo sozinho,
Orientam-se às recompensas infindas de sua devoção.
Ah...Meus poucos presentes e a demora da paz;
As rimas dos versos do mundo, são tantas e mais,
e existem, por perto ou nem tanto, ao talento arguto
Dos versos de nossa análoga composicão.
...
Luiz Felipe Angulo Filho

sexta-feira, 6 de julho de 2007

.:: Falsa ode às lagrimas do mundo ::.

"Enquanto acusava a mim de dor, -
E, porquanto, me tinha solitário de tantos confortos -
Enfraquecia-me em domicílio,

detestando o tempo e a água fria.
Eis que aludia-me a gramática de versos muitos

e esforçava-me, ao menos, às prosódias de
minha boca em satisfação a mim.
Tinha por tanto que ocupava um papel de
finório,
por isso as palavras difíceis, sem uso
sequer;

Ao fim de exprimir este movimento de
mim,
em aclamar por ser e nem tanto sentir,
o que me encontro sobejamente;
Sinto como apenas sentisse,
exaustivamente;

Hei de comprimir meus sentimentos ou,
por então, manifestá-los ao que for aceito
pelos corpos que são outros

e, por assim, reservam distintas
lembranças de histórias comuns.
(Vasculhem os auxílios gramaticais; és
improfícuo, vão a traduzir a alma humana. Nem sei que insisto…)


Pus-me em atitude de choro
encoberto,
e permiti as lágrimas que vieram.
Ou simplesmente choro, para aqueles que
vêm tarde.


Em mim mitigaram as laterais da face,
ressecadas da umidade de meu próprio
produto;

Enfim, vi-me em frente ao resto que tinha,
minha vida

(como se apresenta unânime as palavras,
quão fortes se valem; Vida, jamais teremos sequer sinônimo);
Minha vida.

Ao outro lado, defronte, sorria, à todos,
mordidas claras de um couro colorido.
Uma mulher que se faz existir apenas, uma,
apenas;

Portava silhueta recta, pernas compridas
e ao fim de todas duas, pecíolos dourados
apontados ao chão.

O calcanhar era mais alto que os dedos;
Estes suportavam a beleza exagerada de
quem vinha,
minha; Minha última mulher.
Soube de nada, pouco apenas.

Não me pus a decifrar e, então,
edifiquei-me os meus em acariciá-la;
Sabia, a altura, das extravagâncias que
acossava:
Eras uma, de olhos diretos e de
soslaios
e mãos iguais as quais me uno em sonhos de
princesa.

Transfigurava-se à medida em que guardava
sua vigília sem muita esperança,

pois o perdera em outra poesia.
Esposa de desejo excessivo em não desejar;
Repudia o tabaco e da mesma forma esperar.
Pedia-me que fosse, e implorava por
ser.


Ah… Quantos significados têm as
palavras.
Ao que afortuno-me em usá-las passivas,
serão sempre poucas, que acham?
És comovente o sentimento;
A impossibilidade de resumo,
mas confusas e poucas.
São estas as palavras que
trago,
em inumeráveis linhas quais
significam o labirinto em que convido-os.

Pobre dos amantes...
Incompreendidos e, pior, mesmo tendo com
todos,
mal saberão o que são, amantes, que amam
e, alguns,
improvisam versos de afirmações repetidas,
como as minhas linhas de tristeza e completude.

É amor e amiúde, sustido e oprimido
pelas poucas opções das palavras.


Ela, de unhas vizinhas ao chão, me veio ao
regaço;

Via, por este instante, o que jamais
buscarei aventura em descrever

Chegava-me a comenda de outrora, encargo
antigo e amigo

Pedira, igualmente, que o tempo fosse
bom,
em princípio quando mais verosímel ao
choro -
Chorar é palavra de poesia, contudo
acontece -
E ao reconhecer a sombra no chão de uma
alma,
olhardes para nós, vida, e, por assim,
satisfaça-te a ti na conquista de tantos
outros corações.

Muito embora, a dor não sumira,
o choro insiste e a solidão entorpecida em
ainda ser;
consome-nos sem razão, mas o faz.
As dores de antes, insistem.
Assim, ao que não posso não ter contigo,
vida,
o papel de estéril, molesto;
Basto e agradeço, adormecido,
dolorido e apaixonado."

Luiz Felipe Angulo Filho


quinta-feira, 5 de julho de 2007

LIRA DO AMOR ROMÂNTICO ou a eterna repetição

Esta sequência de versos de Drummond, na minha primeira leitura, foi me chamar atenção lá pelo seu final. Então o reli, uma, e outra e mais uma, ao passo que encontrava novidades e, então, já sabia qual seria minha próxima postagem por aqui. Boa leitura!
...

Atirei um limão n'água
e fiquei vendo na margem.
os peixinhos responderam:
Quem tem amor tem coragem

Atirei um limão n'água,
e caiu enviesado.
Ouvi um peixe dizer:
Melhor é o beijo roubado.

Atirei um limão n'água,
como faço todo ano.
Senti que os peixes diziam:
Todo amor vive de engano

Atirei um limão n'água,
como um vidro de perfume.
Em coro os peixes disseram:
Joga fora teu ciúme.

Atirei um limão n'água,
mas perdi a direção.
Os peixes, rindo, notaram:
Quanto dói uma paixão!

Atirei um limão n'água,
ele afundou um barquinho
Não se espantaram os peixes:
faltava-me o teu carinho.

Atirei um limão n'água,
o rio logo amargou.
Os peixinhos repetiram:
É dor de quem muito amou.

Atirei um limão n'água,
o rio ficou vermelho
e cada peixinho viu
meu coração num espelho.

Atirei um limão n'água,
mas depois me arrependi.
Cada peixinho assustado
me lembra o que já sofri.

Atirei um limão n'água,
antes não tivesse feito.
Os peixinhos me acusaram
de amar com falta de jeito.

Atirei um limão n'água,
fez-se logo um burburinho.
Nenhum peixe me avisou
da pedra no meu caminho.

Atirei um limão n'água,
de tão baixo ele boiou.
Comenta o peixe mais velho:
Infeliz de quem não amou.

Atirei um limão n'água,
antes atirasse a vida.
Iria viver com os peixes
a minh'alma dolorida.

Atirei um limão n'água,
pedindo à água que o arraste.
Até os peixes choraram
porque tu me abandonaste.

Atirei um limão n'água.
Foi tamanho o rebuliço
que os peixinhos protestaram:
Se é amor, deixa disso.

Atirei um limão n'água,
não fez o menor ruído.
Se os peixes nada disseram,
tu me terás esquecido?

Atirei um limão n'água,
caiu certeiro: zás-trás.
Bem me avisou um peixinho:
Fui passado pra trás.

Atirei um limão n'água,
de clara ficou escura.
Até os peixes já sabem:
você não ama: tortura.

Atirei um limão n'água
e caí n'água também,
pois os peixes me avisaram,
que lá estava meu bem.

Atirei um limão n'água,
foi levado na corrente.
Senti que os peixes diziam:
Hás de amar eternamente.
Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 2 de julho de 2007

Motivo

Volto à poesia dos bons. E dos grandes desta vez. Como estou de descanso, reli senão todas, grande parte dos contos e poesias que tenho por aqui. Fiquei satisfeito, especialmente com a sinceridade proposta; Com o resultado e o significado de cada uma delas e, assim, vi Cecília Meireles. Não me lembro de cabeça agora se tenho outra por aqui além de Cecília, mas a predominância dos que assinam minhas postagens é toda masculina. É certo que boa parte das linhas que trouxe vieram de cabeças masculinas inspiradas pela mulher, mas ela também assume autoria, se inspira e escreve e muito!
...

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.


Cecília Meireles