Para quem já tentou escrever um Soneto - uma poesia, uma letra de música - já se pegou desconfortável com uma rima que não vem. Como se a rima fosse a responsável pelo sucesso da obra e não seu conteúdo. Eu já li poemas vazios, cheios de rimas, com palavras difíceis que nem sabia o significado naquela hora. A verdade é que existem estilos: Vinícius sequer falava ao telefone sem rimar, mas também jamais abriu mão do conetúdo. Drummond aparentemente já não se importava com isso, com as rimas, criou versos profundos, com poucas e as mesmas palavras, mas simetricamente ordenadas entre pronomes e parágrafos. Quanto mais me dedico a conhecer Drummond, mais entretido e admirado fico.
Quero que todos os dias do ano
todos os dias da vida
de meia em meia hora
de 5 em 5 minutos
me digas: Eu te amo.
Ouvindo-te dizer: Eu te amo
creio, no momento, que sou amado.
No momento anterior
e no seguinte, como sabê-lo?
Quero que me repitas até a exaustão
que me amas que me amas que me amas.
Do contrário evapora-se a amação
pois no dizer: Eu te amo, desmentes
apagas teu amor por mim.
Exijo de ti o perene comunicado.
Não exijo senão isto,
isto sempre, isto cada vez mais.
Quero ser amadopor e em tua palavra
nem sei de outra maneira a não ser esta
de reconhecer o dom amoroso,
a perfeita maneira de saber-se amado:
amor na raiz da palavra e na sua emissão,
amor feito com vibração espacial.
No momento em que não me dizes:
Eu te amo,
inexoravelmente sei
que deixaste de amar-me,
que nunca me amaste antes.
Se não me disseres urgente repetido
Eu te amoamoamoamoamo,
verdade fulminante que acabas de desentranhar,
eu me precipito no caos,
essa coleção de objetos de não-amor.
Carlos Drummond de Andrade