terça-feira, 14 de outubro de 2008

Logo eu?

Jamais fui tímido neste espaço ao referir-me de minha admiração por Chico. Há poucos, dei uma passada nas postagens mais antigas e Drummond e Pessoa ainda estão em primeiro lugar em número de citações, mas já há muito de Chico! Especialmente as coisas que me são familiares, ou foram-me em algum momento. Mais do que familiares, as intervenções de Chico são impressionantemente precisas! Há duas semanas, fui à um show de Mônica Salmaso interpretando apenas canções dele. No espetáculo, entre outros momentos extraordinários, ela conta com excelente humor uma passagem em que ao compor "Ode aos Ratos", Chico ligou para Paulo Vanzolini (músico, poeta e zóologo) com a intenção de entender um pouco mais sobre os Ratos: "Paulo, é o Chico. Preciso para uma composição entender um pouco mais sobre os ratos. Como eles são realmente? Como é o nariz do rato? É gelado?(...)", e Paulo disse "Chico, você mente tanto sobre as mulheres, por que não mente sobre os ratos também?", "Por Favor, Paulo" (disse Chico), "Eu tenho um profundo respeito pelos ratos!".

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Logo eu?

Essa morena quer me transtornar
Chego em casa, me condena
Me faz fita, me faz cena
Até cansar
Logo eu, bom indivíduo
Cumpridor fiel e assíduo
Dos deveres do meu lar
Essa morena de mansinho me conquista
Vai roubando gota a gota
Esse meu sangue de sambista

Essa menina quer me transformar
Chego em casa, olha de quina
Diz que já me viu na esquina a namorar
Logo eu, bom funcionário
Cumpridor dos meus horários
Um amor quase exemplar
A minha amada
Diz que é pra eu deixar de férias
Pra largar a batucada
E pra pensar em coisas sérias
E qualquer dia
Ela ainda vem pedir, aposto
Pra eu deixar a companhia
Dos amigos que mais gosto
E tem mais isso:Estou cansado quando chego
Pego extra no serviço
Quero um pouco de sossego
Mas não contente
Ela me acorda reclamando
Me despacha pro batente
E fica em casa descansando

Chico Buarque