sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Meus oito anos

Aqui na Consultoria que trabalho estamos passando por mudanças: Novos sistemas, procedimentos de trabalho, uma nova estrutura, enfim, mudanças. Inclusive tivemos há pouco o que chamamos de "Sensibilização às Mudanças" - Pois sempre têm os receosos, os menos confiantes, os resistentes e a idéia é evoluir.
Bom, também na vida pessoal passo por mudanças. Aliás, todos os dias! Mas tenho objetivos, vejo crescimentos e ganhos em todas as horas, boas e ruins, e, claro, o objetivo é evoluir. E não só o meu, mas como o de todas as pessoas. Mas em paralelo com as mudanças, conhecemos também as dificuldades com elas caminham as lembranças de outras épocas de nossas vidas. Foi aí que resolvi, finalmente, postar Casimiro de Abreu. Boa leitura!


Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!


Como são belos os dias
Do despontar da existência!
— Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é — lago sereno,
O céu — um manto azulado,
O mundo — um sonho dourado,
A vida — um hino d'amor!


Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar!
O céu bordado d'estrelas,
A terra de aromas cheia
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!


Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã!
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minhã irmã!


Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberta o peito,
— Pés descalços, braços nus
— Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!


Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!

Casimiro de Abreu

quarta-feira, 22 de novembro de 2006

Reinvenção

A vida só é possível reinventada.

Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas...
Ah! tudo bolhas
que vem de fundas piscinas
de ilusionismo... — mais nada.

Mas a vida, a vida, a vida, a vida
só é possível reinventada.

Vem a lua, vem, retira
as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços
cheios da tua Figura.
Tudo mentira!
Mentirada lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcanço...
Só — no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva.
Só — na treva, fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível reinventada.

Cecília Meirelles

segunda-feira, 13 de novembro de 2006

Grito de Alerta

Procuro manter, dentro das limitações da rotina, este blog não só atualizado, mas em sincronia fina com os meus sentidos, meus momentos. Na mesma medida que recebo novas informações, tento, de alguma forma, compartilhar com a poeisa ou com a música, por meio do blog. Isso só seria possível, ao meu ver, com a contribuição de pessoas. Que acompanham meu blog, mandam sugestões etc. Esta postagem de hoje é também uma música, mas de uma pessoa muito especial. Não. A mais especial. como ela mesmo disse, Gonzaguinha dos disse muita coisa boa, como "(...) a beleza de ser um eterno aprendiz". Mas agora veja "Grito de Alerta". Boa leitura!

Primeiro você me azucrina, me entorta a cabeça
Me bota na boca um gosto amargo de fel
Depois vem chorando desculpas, assim meio pedindo
Querendo ganhar um bocado de mel

Não vê que então eu me rasgo, engasgo, engulo
Reflito e estendo a mão
E assim nossa vida é um rio secando
As pedras cortando e eu vou perguntando:até quando?
São tantas coisinhas miúdas, roendo, comendo
Arrasando aos poucos com o nosso ideal
São frases perdidas num mundo de gritos e gestos
Num jogo de culpa que faz tanto mal

Não quero a razão pois eu sei o quanto estou errado
o quanto já fiz destruir
Só sinto no ar o momento em que o copo está cheio
E que já não dá mais prá engolir
Veja bem,nosso caso é uma porta entreaberta
Eu busquei a palavra mais certa
Vê se entende o meu grito de alerta
Veja bem,é o amor agitando meu coração
Há um lado carente dizendo que sim
E essa vida da gente gritando que não.


Gonzaguinha

terça-feira, 7 de novembro de 2006

Deixei de ser aquele que esperava

Fernando Pessoa é provavelmente um dos Poetas mais precisos e complexos da literatura. Ao mesmo tempo em que reúne palavras que já cairam no desuso, acompanham seus versos mensagens quase religiosas, filofóficas, sobre sentidos da vida. Boa leitura!

Deixei de ser aquele que esperava,
Isto é, deixei de ser quem nunca fui...
Entre onda e onda a onda não se cava,

E tudo, em ser conjunto, dura e flui.
A seta treme, pois que, na ampla aljava,
O presente ao futuro cria e inclui.
Se os mares erguem sua fúria brava
É que a futura paz seu rastro obstrui.

Tudo depende do que não existe.
Por isso meu ser mudo se converte
Na própria semelhança, austero e triste.

Nada me explica. Nada me pertence.
E sobre tudo a lua alheia verte
A luz que tudo dissipa e nada vence.

Fernando Pessoa